Quarta parte do trabalho envolvendo a participação do General Olympio Mourão Filho nos episódios que desencadearam no Golpe Civil-Militar...
Quarta parte do trabalho envolvendo a participação do General Olympio Mourão Filho nos episódios que desencadearam no Golpe Civil-Militar de 1964. Vamos conhecer neste capítulo, o Mourão legalista, defensor da Constituição, e da posse de João Goulart, quando os Ministros militares já tramavam, em 1961, para impedir sua posse. Nada, neste período indicaria que Mourão viesse a ser pouco mais tarde um dos maiores responsáveis pela derrubada do presidente.
Em razão do episódio da renúncia de Jânio Quadros, os três chefes supremos das Forças Armadas, os ministros militares, se reuniram para discutir o grave momento político por que passava o Brasil, e acharam por bem lançar um Manifesto à Nação em 30 de agosto de 1961, no qual podemos perceber o que tanto os preocupava naquele momento. Pelo manifesto, os ministros, especialmente o Marechal Odylio Denys, Ministro da Guerra, estavam receosos de que a posse de João Goulart pudesse representar, de acordo com suas concepções, a abertura de portas no Executivo para que grupos comunistas tomassem conta do poder. Os ministros militares atribuem um papel destacado de Jango na incitação da subversão desde que ele era Ministro do Trabalho, como podemos ver num trecho do manifesto:
“Já ao tempo em que exercera o cargo de ministro do Trabalho, o Sr. João Goulart demonstrava, bem às claras, suas tendências ideológicas, incentivando e mesmo promovendo agitações sucessivas e frequentes nos meios sindicais, com objetivos evidentemente políticos e em prejuízo mesmo dos reais interesses de nossas classes trabalhadoras. E não menos verdadeira foi a ampla infiltração que, por essa época, se processou no organismo daquele Ministério, até em postos-chave de sua administração, bem como nas organizações sindicais, de ativos e conhecidos agentes do comunismo internacional, além de incontáveis elementos esquerdistas”.[1]
A intenção de Denys e dos ministros que assinaram o manifesto, era o impedimento puro e simples de Goulart. É o que também afirma o historiador Thomas Skidmore. Segundo ele, os ministros militares queriam que houvesse novas eleições num prazo de 60 dias, com Ranieri Mazzilli como presidente interino. [2]
Olympio Mourão Filho não concordava com a posição dos ministros. Apesar de não simpatizar com Jango e de criticar o Congresso, por não ter criado um artifício legal para o impedimento do vice, por ocasião da votação da emenda constitucional nº4 que implantara o regime parlamentarista no país em 2 de setembro — já que, segundo ele, “a linha de sucessão ficava interrompida naturalmente com a supressão do regime presidencialista”[3] — resolveu colocar-se, naquele momento, ao lado dos legalistas, defendendo a posse do vice-presidente, porque assim a Constituição determinava. É o que afirma numa conversa com o Marechal Lott em setembro de 1961.[4] Mostra-se um defensor da lei. Além disso, ao contrário de certas camadas anticomunistas do Exército, representadas eminentemente pelo então Ministro da Guerra, Marechal Odylio Denys, Mourão Filho não via, a princípio, o perigo comunista que os militares radicais queriam imputar num possível governo Jango. Antes disso, preferiu canalizar todas as suas críticas ao sistema presidencialista em si, e até à classe política de modo geral. É o que podemos constatar em seu livro de memórias. Segundo ele acreditava, era perigoso um sistema que dava amplos poderes a uma só pessoa, eleita, por sua vez, por um povo sem condições de escolher o melhor para si:
“... mais cedo ou mais tarde, o eleitorado, incapaz de fazer um milagre, tangido pela política profissional, elegerá um presidente medíocre ou mau e o processo continuará até atingirmos de novo o clima político e social insuportável, que conduzirá dialeticamente a outra revolução ou à continuação do que foi feita”.[5]
continua…
[1] DENYS, Odylio. Ciclo Revolucionário Brasileiro. Ed. Nova Fronteira. Rio de Janeiro, 1980.
[2] SKIDMORE, Thomas: Brasil: de Getúlio a Castelo (1930-1964). Paz e Terra, São Paulo, 1982
[3] MOURÃO FILHO, Olympio. Memórias: A Verdade de um Revolucionário. L&PM Editores. Porto Alegre. 1978
[4] De acordo com o seu diário: “Marechal, sou contra esse golpe, não admito ditaduras nem tampouco que se impeça a posse do vice-presidente, de acordo com a Constituição, que não pode ser violada!”
[5] MOURÃO FILHO, Olympio. Memórias: A Verdade de um Revolucionário. L&PM Editores. Porto Alegre. 1978