Nesta terceira parte sobre os antecedentes do Golpe Civil-Militar de 1964, vamos conhecer um pouco mais da biografia controversa do General...
Nesta terceira parte sobre os antecedentes do Golpe Civil-Militar de 1964, vamos conhecer um pouco mais da biografia controversa do General Mourão Filho. Também vamos saber o papel do escritor Helio Silva na divulgação de importantes documentos pessoais do militar, que, doente, não chegou a ver a publicação de sua obra. Mourão morreu amargurado, pelos rumos que sua “revolução” veio a tomar nas mãos dos militares de linha dura. De legalista, a conspirador.. e por fim, arrependido.
Mourão aparece pela primeira vez no cenário nacional em 1937 quando viria a ter um papel importante, embora indireto, no Golpe do Estado Novo. A Ação Integralista Brasileira (AIB) era um partido político lançado por Plínio Salgado em outubro de 1932 nos moldes fascistas e nacionalistas, que estavam então em pleno vigor na Europa. Nos anos posteriores à sua fundação, teve um rápido crescimento nos seus quadros, atraindo desde intelectuais até militares. Um destes militares foi o então capitão Olympio Mourão Filho. Em 1937, servia no Estado-Maior do Exército e dirigia o serviço secreto da AIB, quando foi solicitado por Plínio Salgado para que produzisse um documento fictício de caráter interno do partido, simulando como seria um possível ataque revolucionário comunista. Era o Plano Cohen. Numa conversa informal, na casa do general Álvaro Mariante, o documento foi então apresentado por Mourão Filho ao anfitrião. Mariante então resolveu mostrar o documento ao General Góes Monteiro. A partir deste momento, o Plano Cohen ganharia as manchetes dos jornais e sua autoria fora imputada aos comunistas, sendo utilizado para fins políticos[1]. Medo e incertezas propiciaram a Getúlio Vargas pressionar o Congresso por um novo “estado de guerra”. Dessa forma, Vargas conseguiu abrir caminho para a consolidação do golpe do Estado Novo, em 10 de novembro de 1937.
AIB, imitação tupiniquim do fascismo, liderada por Plínio Salgado (centro)
Se a participação de Mourão Filho neste golpe foi discreta e indireta, como autor de um documento que viria a ser usado à sua revelia, o mesmo não acontece vinte e sete anos mais tarde, durante o Golpe Militar de 64, quando veio a ser uma das figuras mais proeminentes e atuantes.
No começo dos anos 70, Olympio Mourão Filho, que estava internado com problemas de saúde, entregou ao escritor e jornalista Helio Silva seis pastas contendo seus diários de memórias. Estes escritos, que constituem “o único registro, dia-a-dia, do nascimento e do desdobramento da conspiração e da eclosão do movimento de 31 de março de 1964” [2], se tornaram o livro Memórias: A Verdade de um Revolucionário, que foi publicado sete anos depois, quando ele já havia morrido. Sua intenção era “deixar apontamentos relativos aos fatos, a fim de permitir a historiadores futuros, não envolvidos diretamente neles, a tarefa de relatar imparcialmente os eventos”[3].
Estes escritos constituem documento valioso como objeto de análise para podermos compreender as motivações do Golpe de 64 e os fatos que o precederam, através da ótica de um importante participante ativo dos eventos narrados. Neste livro de memórias, poderemos notar as razões da virada de pensamento de Mourão Filho, que no primeiro momento da renúncia de Jânio Quadros se coloca ao lado dos legalistas — a favor, portanto, da posse de João Goulart — mas que logo a seguir, conspira diuturnamente para derrubá-lo do poder. Também podemos perceber que, a princípio, e ao contrário de alguns dos mais eminentes militares como o Marechal Odylio Denys, ele não era um militar anticomunista radical típico e não via esse tipo de perigo no governo de João Goulart, mas que “abriu os olhos” após um jantar com o comandante do I Exército e com o então governador do Rio Grande do Sul, Leonel de Moura Brizola, bem como com o plebiscito que instituiu a volta do sistema presidencialista e com o Comício da Central do Brasil em 13 de março de 1964. [4]
[1] SILVA, Helio. A Ameaça Vermelha: O Plano Cohen. L&PM Editores. Porto Alegre. 1980
[2] MOURÃO FILHO, Olympio. Memórias: A Verdade de um Revolucionário. L&PM Editores. Porto Alegre. 1978
[3] Idem
[4] Idem