Os debates entre defesa e acusação no julgamento do estudante Gil Rugai, de 29 anos, que acabou de ser condenado a 33 anos de prisão, deixar...
Os debates entre defesa e acusação no julgamento do estudante Gil Rugai, de 29 anos, que acabou de ser condenado a 33 anos de prisão, deixaram evidentes como funciona a dinâmica de um processo na Justiça. Muitas vezes, mais do que as provas periciais, é o poder do convencimento do advogado que sensibiliza os membros do Júri popular de que o réu é ou não culpado. Pra isso, eles recorrem frequentemente à lógica, para determinar a validade de suas teses.
Mas para mostrar que a busca pela verdade em um julgamento pode ser muito mais complicada do que apenas achar os “furos” da lógica rival, eu resolvi reeditar uma parábola contada por Martin Cohen em seu livro 101 problemas de Filosofia, que nos ajuda a entender como um julgamento pode ser difícil, e muitas vezes, injusto.
O problema de Protágoras
Euathlos começou a estudar para ser advogado. Seu professor, Protágoras, combinou, muito generosamente, que o aluno só pagaria as aulas depois de seu primeiro processo, se o ganhasse.
Depois de gastar muitas horas instruindo o aluno, Protágoras ficou bem aborrecido quando Euathlos, seu aluno, resolveu tornar-se um músico sem nunca chegar a assumir um processo no tribunal. Foi então que Protágoras exigiu que Euathlos lhe pagasse as aulas, e quando o músico se recusou, o professor resolveu processá-lo, pois raciocinou que, se Euathlos perdesse a causa, ele, Protágoras, teria vencido, e receberia seu dinheiro. E além disso, se Protágoras perdesse, Euathlos teria ganho sua primeira causa e, apesar de suas declarações de agora ser um músico, teria que pagar igualmente.
Euathlos, porém, raciocinou diferente. "Se eu perder", pensou ele, "terei perdido o meu primeiro processo no tribunal e nesse caso, o acordo inicial me livra de ter de pagar o curso. Se eu ganhar, Protágoras terá perdido o direito de me obrigar a honrar o contrato. Aí também não precisarei pagar coisa alguma".
Não é possível que todos os dois tenham razão. Mas quem está errado?
Esse é o tipo de problema que os gregos antigos adoravam discutir na sua época. Não há aí nenhuma pegadinha ou truque, apenas um genuíno problema de lógica. Não existe uma resposta “certa” para esta questão, mas um juiz teria que dar uma sentença para o caso. Você arriscaria opinar?
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COHEN, Martin. 101 problemas de filosofia. São Paulo: Loyola, 2006. p. 24.