A queda do Muro de Berlim e a derrocada das utopias socialistas tiveram um impacto político e econômico no mundo por demais conhecido: a ...
A queda do Muro de Berlim e a derrocada das utopias socialistas tiveram um impacto político e econômico no mundo por demais conhecido: a ascensão de uma única potência hegemônica e de sua ideologia configurada no modelo neoliberal são os exemplos mais notórios. Mas a perplexidade com a queda do comunismo e com a Nova Ordem Mundial afetou também historiadores e professores. O resultado? Ceticismo com relação ao valor do conhecimento histórico e de seu potencial transformador; difusão de novas tecnologias de massa que condenaram os livros e os professores à obsolescência. É essa problemática, bem como possíveis soluções, que é discutida no livro História na Sala de Aula – Conceitos, Práticas e Propostas.
Muitos professores, com medo desse perigo de se tornarem dispensáveis, resolveram acompanhar essa guinada histórica. Segundo os autores Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky no capítulo “Por uma História prazerosa e consequente”, “na sala de aula, o pensamento analítico é substituído por ‘achismos’”. Os alunos substituem pesquisas em livros por pesquisas em sites duvidosos, e videos-resumos substituem a própria leitura. “O conteúdo da disciplina foi deixado de lado, a erudição foi considerada coisa de esnobes e a leitura de História prejudicada por tal simplismo”.
Por conta da derrocada do socialismo (real ou teórico), os professores, desencantados, abraçaram a causa imediatamente oposta, a neoliberal. O livro, no entanto, aponta que é possível trilhar um caminho alternativo, com uma prática de ensino rica em conteúdo, sem nostalgia de tempos passados. Defendem um ensino humanista, erudito, no sentido de se ter conteúdo baseado em muitas leituras e a aproximação do aluno com o legado do patrimônio cultural da humanidade. Afinal de contas, “qual é o papel do professor senão estabelecer uma articulação entre [esse legado] e o universo cultural do aluno?”
Sem conteúdo, esse aluno, e mais tarde o adulto, se tornarão pessoas acríticas, dando opiniões vazias sobre tudo e sobre o nada, como vemos bastante no nosso dia-a-dia. Essas pessoas têm uma opinião pronta na ponta da língua, sem nunca terem se dado ao luxo de conhecer o mínimo sobre o assunto em questão. Daí vemos as pérolas argumentativas que vemos por aí, recheadas de valores de outras classes e de lugares-comuns, fruto do despreparo intelectual do brasileiro médio.
“Um país cuja população não sabe ler, que, quando sabe, lê pouco, e quando finalmente lê, pouco entende (segundo a constatação insuspeita de um órgão da própria ONU) não tem muitas chances num mundo competitivo e exigente de qualificação de sua força de trabalho”
Assim, somente o incentivo à leitura pode salvar este país. A infra-estrutura dos portos, das estradas, de energia, frequentemente são citados por especialistas como um gargalo que pode travar o crescimento do Brasil. Eu digo que este gargalo é a Educação. Se continuarmos virando as costas para ela, mantendo nosso povo na ignorância e no despreparo, vamos pagar um preço altíssimo no futuro. Um bom começo é através dos livros, matéria-prima que fornece o conhecimento. A moda atual de substituí-los por pesquisas de internet e debates vazios está levando a um progressivo empobrecimento cultural de alunos e professores. Sem livros, não pode haver pensamento crítico. “Só se debate ideias se antes as tivermos”. Sem isso, a História se torna mero conhecimento de almanaque, e somos obrigados a engolir porcarias editoriais como as obras dos oportunistas (no mau sentido) Leandro Narloch e Eduardo Bueno. A História pode muito mais que isso, e devemos valorizá-la para que ela possa servir como instrumento de verdadeiro conhecimento.
Fonte:
KARNAL, Leandro (org.) História na Sala de Aula: conceitos, práticas e propostas. 3ª Ed. São Paulo: Contexto, 2005